sábado, 20 de março de 2010

O português é uma chave para desvendar o cérebro

Ao ensinar meu filho algumas coisas sobre a língua portuguesa, eu lhe disse, em certo momento:

"O cérebro é uma máquina de produzir textos"

Mas por que eu disse isto?

Eu estava dando a ele o exemplo de como ele conta os fatos de sua vida para os colegas. A situação que eu utilizei foi a de um acidente. Eu supus que ele chegasse na escola, em sua classe, e contasse que acabou de ver um acidente.

A imagem que ele tem do acidente é um quadro impressionista onde existe um carro preto e um carro branco. Então ele diria, como índio (brinquei com ele para tornar a situação a mais primitiva possível):

"Acidente carro preto carro branco".

Seus colegas, obviamente, ouvindo este "discurso indígena", diriam:

"Como assim ? Explica melhor."

Então meu filho diria:

"Acidente, carro preto bateu carro branco."

Ainda é uma linguagem de índio, mas já apareceu um verbo. Seus colegas ainda não ficariam satisfeitos, e diriam:

"Você estava num dos carros, te contaram, ou você viu ?"

Meu filho refaria a frase:

"Eu vi acidente. Carro preto bateu carro branco."

Os colegas perguntariam:

"O carro preto bateu no carro branco ou o contrário ?"

Meu filho responderia agora:

"Eu vi um acidente. Um carro preto bateu num carro branco."

Mas este verbo ver fez parte do acidente ? Não, mas como um fato, sem observação e sem observador, é como se não existisse para a sociedade que o cerca, como se fosse um crime não descoberto, aquele que faz o discurso, que narra o fato, o narrador, precisa se incluir na ação, mesmo começando com:

"Eu ouvi dizer ..."

Esta necessidade de detalhes é fruto da incapacidade dos cérebros (das pessoas) compreenderem os fatos que não viram pela via narrativa.

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